terça-feira, 28 de setembro de 2010

do nada

...e descobriu o xampu que tinha o cheiro dos cabelos dela. Não que ele quisesse encontrá-la novamente, até porque na vida dele talvez nem houvesse mais espaço pra ela. Eles eram daquelas amizades floridas, onde um conforta o outro como cobertor em noite de inverno. Mas ele era muito temperamental, meu Deus! Na verdade, temperamento era qualidade. O defeito era a tempestade que ele trazia no olhar toda vez que não gostava de algo. Claro que ela, por mais que gostasse dele, não ia suportar ver seu barco naufragar toda vez que o mar de olhos verdes resolvesse lançar sobre ele algumas nuvens cinzas, sons de trovoadas e ondas de não-flores. Chega uma hora que todo mundo cansa, não é, meu jovem? Acho até que você está cansado de ficar sempre na mesma posição ouvindo-me. Vou abrir a janela pra que o vento faça seu mensageiro funcionar. Pra evitar o tédio refiz a estrutura da poltrona pra que ela se incline. Assim está bom? Ótimo! Mas não vale dormir enquanto eu falo. Como já é tarde no tempo do seu mundo, vamos logo começar a história do coração sem sala. Foi assim...

sábado, 4 de setembro de 2010

do menino que voava (mini-parte I)

Era interessante ver como ela se comportava quando ele estava por perto: quase sólido o não-movimento da sua boca. Era de uma intriga inefável, de um gorjear audível no mais profundo silêncio da alma. Mas ela queria ele que não queria ela, era quase como se um descompletasse o outro. Entretanto, como todo começo, tudo começou de uma forma inesperada. Eles trocaram olhares numa noite fodida qualquer em um bar de quinta categoria. Foi quase que automático. As sextas-feiras na cidade em que viviam eram tediosas. O máximo era quando ocorria uma festa ou algo parecido, caso contrário, teria sempre um ou dois botecos para salvar a noite. Ele pediu gym seco naquele dia. Nunca tinha tomado gym, até descobrir que tinha cheiro de perfume. Ela gostava de bebidas quentes e rápidas, então pediu uma tequila. Ela, bonita em sua pele alva, bebia sozinha. Não um beber conjugado por qualquer pessoa que pede algo com álcool, mas um beber desesperado, como que quem bebe para afogar não as mágoas, mas a alma.

- Traga uma tequila também!
- Mas você não já está bebendo gym?
- E você não já está bebendo tequila?
- Zoé.
- João. E então, o porque da bebida solitária?
- Uma garota não pode sair e tomar uma sozinha?
- Não, porque sempre vai ter um cara também sozinho que vai pedir a mesma bebida que ela pra puxar assunto, mesmo que ele já esteja bebendo outra coisa.